Visitantes passam perto de uma réplica da Arca de Noé em Williamstown, Kentucky. (Foto: John Minchillo/AP)
Com 300 côvados de comprimento, 50 de largura e 20 de altura - as unidades de medida arcaicas sugeridas pelo Antigo Testamento -, uma nova Arca de Noé acaba de ser inaugurada na cidade americana de Williamstown, após anos de controvérsia.
A embarcação é o carro-chefe do parque temático religioso Ark Encounter e sua construção, que levou seis anos, custou US$ 100 milhões (R$ 330 milhões). As obras foram financiadas por doações privadas.
A arca demandou quase 8 mil metros cúbicos de madeira e suas medidas (desta vez no sistema métrico) são 155m x 26m x 15m. Dimensões que, segundo a Bíblia, foram as exigidas por Deus quando ordenou a Noé a construção da embarcação usada para preservar as espécies animais durante o Dilúvio.
No interior, há três pisos explicando a história contada no Gênesis. Há 100 modelos de animais, incluindo uma polêmica participação de dinossauros.
Não há qualquer referência no primeiro livro da Bíblia à presença de criaturas pré-históricas na arca, até porque, segundo a ciência, estes animais foram extintos mais de 150 milhões de anos antes do surgimento do primeiro ancestral humano.
Porém, os idealizadores do parque incluíram os dinossauros como parte de sua defesa da teoria de que Deus criou todos os seres vivos.
A Answers in Genesis ("Respostas em Gênesis", em tradução literal), empresa por trás do projeto, disse à BBC Mundo, serviço em espanhol da BBC, que espera receber 16 mil visitantes por dia.
"Em um mundo cada vez mais laico e tendencioso, é hora de nós cristãos fazermos algo", disse Ken Ham, fundador da empresa, durante a abertura do parque na última quinta-feira.
No entanto, a arca atraiu críticas e uma disputa judicial antes mesmo de receber seu primeiro visitante.
"Básicamente, este barco é uma capela criando filhos cientificamente analfabetos", disse à agência de notícias AP Jim Helton, morador vizinho ao parque.
Incentivo fiscal
Uma das críticas à Answers in Genesis é que a empresa inicialmente teve aprovada uma verba de US$ 18,25 milhões (R$ 60 milhões) em incentivos fiscais com base na Lei de Desenvolvimento Turístico do Estado do Kentucky.
O governo chegou a cancelar o repasse depois de que veio a público o fato de a Answers in Genesis exigir que seus empregados declarem por escrito, em contrato, sua fé cristã.
Mas a empresa venceu a causa na Justiça usando como argumento a Primeira Emenda da Constituição Americana - justamente a que fala em liberdade religiosa.
A Answers in Genesis afirma que não recebeu "dólar algum dos contribuintes" para construir a arca, e que o incentivo veio do não recolhimento de impostos sobre a venda de ingressos, comida e outros produtos.
"A lei permite deduzirmos impostos sobre as vendas até US$ 18,25 milhões por um prazo de 10 anos", disse Mark Looy, porta-voz da empresa.
'Declaração de Fé'
Looy explicou ainda que a "Declaração de Fé" que os empregados precisam assinar tem o propósito de "preservar o funcionamento e a integridade da empresa em sua missão de anunciar a verdade absoluta e a autoridade das Escrituras e para proporcionar um modelo bíblico a nossos empregados".
Os funcionários precisam reconhecer a Bíblia como "a autoridade suprema" e que o Dilúvio é um "fato histórico", bem como a existência de Deus e o Diabo.
"Qualquer forma de imoralidade, como o adultério, sexo por prazer, homosexualidade, lesbianismo, conduta bissexual, bestialismo, incesto, pornografia ou qualquer intenção de mudar de gênero é pecado e ofensivo a Deus", diz a declaração.
Para o juiz Greg van Tatenhove, porém, a empresa tem liberdade para fazer suas contratações.
"Somos uma organização religiosa e a lei nos dá direito a utilizar uma preferência religiosa como base para a nossa contratação", disse Ham em janeiro.
Madeira polêmica
Apesar de o Ark Encounter se apresentar como uma empresa "verde", a quantidade de madeira usada na construção da arca despertou críticas.
Os 153 metros de comprimento da arca ocupam mais que um campo de futebol americano
Mas Looy assegura que os 980 quilômetros de tábuas - se colocadas em linha reta - são de árvores que estavam condenadas por causa de pragas.
Outra crítica ao projeto é relacionada ao design da arca, considerado moderno demais.
"A Bíblia não diz que deveria ser uma caixa retangular", defende Looy.
Os ingressos para visitar o local custam US$ 40 (R$ 132) para adultos e US$ 28 (R$ 92) para crianças.